Caitlin Sampaio Mulholland (Doutorado e Mestrado em direito civil, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2006 e 2002) é professora associada de direito civil do Departa- mento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), onde atualmente coordena a graduação em Direito e o Mestrado em Direito Civil Contemporâneo e Práticas Jurídicas. É professora do programa de pós-graduação em Direito Constitucional e Teoria do Estado da PUC-Rio. É professora pesquisadora do Núcleo Legalite PUC-Rio. Coordenadora do Grupo de Pesquisa DROIT
– Direito e Tecnologia. É autora dos livros “A responsabilidade civil por presunção de causalidade”; e “Internet e Contratação: panorama das relações contratuais eletrônicas de consumo”. É coordenadora das obras: “LGPD e o novo marco normativo no Brasil” e “IA e Direito; ética, responsabilidade e regulação”. É atualizadora da obra “Instituições de Direito Civil”;, volume III, de Caio Mário da Silva Pereira. Membro da Comissão de Direito Civil da OAB,
Seccional Rio de Janeiro.Membro da Comissão de Proteção de Dados e Privacidade da OAB, Seccio- nal Rio de Janeiro. Associada ao Instituto Brasilei- ro de Direito Civil – IBDCivil e à Association Henri Capitant des Amis de la Culture Juridique Françai- se. Associada do Instituto Brasileiro de Estudos em Responsabilidade Civil (IBERC). Integra a Rede Pro- prietas, hoje INCT – Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, projeto internacional: História Social das Propriedades e Direitos de Acesso (Disponível em: www.proprietas.com.br).
Professora, em poucas palavras, como você resume sua trajetória profissional e acadêmica?
Iniciei minhas atividades acadêmicas ainda na graduação em Direito na PUC-Rio, quando fui pesquisadora de iniciação científica sob a orientação da professora Maria Celina Bodin de Moraes. O foco da minha pesquisa na época já era a responsabilidade civil, especialmente os temas de responsabilidade civil objetiva e danos morais. Logo após a conclusão da graduação, fiz mestrado e doutorado na UERJ, sendo também orientada pela professora Maria Celina. Minha dissertação foi sobre contratos eletrônicos de consumo. A tese sobre nexo de causalidade. Logo no primeiro ano do mestrado iniciei minhas atividades como professora. Dei aula em Teresópolis (FESO) e logo depois comecei a dar aulas na PUC-Rio. Também lecionei na Candido Mendes. Na FGV fui responsável pela implementação dos cursos de pós-graduação e de extensão. Hoje sou coordenadora do Mestrado em Direito Civil da PUC-Rio, além de coordenadora da graduação e leciono na graduação e nos cursos de mestrado e doutorado em direito. Além disso, sou líder do grupo de pesquisa DROIT – Direito e Tecnologia que reúne pesquisa- dores da PUC-Rio e da UERJ. O tema da LGPD é constante em nossos debates.
Antes de entrarmos na LGPD, conte para gente,como é ser mulher no meio científico Brasileiro?
Muito difícil, ainda. Não tanto em relação ao ingresso na carreira, mas sim em relação à manutenção de um nível de pesquisa e produtividade se ou quando há a necessidade de conciliar com a maternidade. Aí as mulheres saem perdendo e muito. Mas essa é uma questão muito mais relacionada ao papel que o patriarcado impõe às mulheres, do que especificamente sobre ser mulher pesquisadora. Sobre ser mulher e pesquisadora, o que se percebe é uma incansável luta por reconhecimento, especialmente no que diz respeito à participação em eventos, bancas, publicações, que ainda sofrem um impacto enorme de um machismo estrutural em nossa sociedade.
A respeito do seu recente livro, A LGPD e o novo marco normativo no Brasil, que trata sobre proteção de dados. Como a LGPD impacta na vida do cidadão comum? Principalmente no Brasil?
Ainda há muito o que caminhar no que diz res- peito à proteção de dados no Brasil. Nós temos uma lei que é verdadeiramente protetiva dos di- reitos dos titulares. Contudo, se caminhando ao lado da lei não tivermos uma educação para a proteção de dados pessoais, a lei perde sua efi- cácia. Acredito que se não tivermos um trabalho intenso de aculturamento, o cidadão comum se- quer irá compreender para o que serve esta lei. Daí também a importância de uma ANPD forte e atuante, pois uma de suas atribuições é justa- mente fomentar a compreensão de uma cultura de proteção de dados pessoais.
Qual é o principal dilema entre a LGPD e a res- ponsabilidade civil?
A natureza da responsabilidade civil e os elementos que a caracterizam. A depender da forma que se interpreta o artigo 42 e 44, o titular dos da- dos terá uma maior ou menor carga de prova a ser realizada em caso de uma ação indenizatória. Então, se se entende que a responsabilidade civil tem uma natureza subjetiva, o titular de da- dos, vítima de eventual dano, terá que compro- var que o agente de tratamento agiu com culpa, isto é, descumpriu padrões de segurança exigi- dos. Se a responsabilidade for objetiva, basta à vítima comprovar que os seus dados são trata- dos e que houve um dano decorrente deste tratamento, pouco importando se há ou não culpa por parte do agente de tratamento. Parece pouco, mas a carga da prova por vezes impede à vítima do dano de ser ver ressarcida de um dano in- justo por ela sofrido.
Professora, poderia nos indicar livros e séries para nos aprofundamos no assunto da LGPD?
Sobre proteção de dados pessoais, sugiro os seguintes livros, “A vida na sociedade e vigilância”, e Stefano Rodotà; “Da privacidade à proteção de dados”, do Danilo Doneda; “Privacidade, proteção de dados e defesa do consumidor”, da Laura Schertel; e “Proteção de dados pessoais”, do Bruno Bioni. Além desses, sugiro tam- bém o livro organizado pelo Gustavo Tepedino, Ana Frazão e Milena Donato Oliva “Lei geral de proteção de dados pessoais”. Séries recomendo “Privacidade hackeada”, “Dilema da rede”, “Black Mirror”, “Terms and conditions may apply”, entre outras tantas.
Como professora, o que você indica para quem estar começando na área de direito digital e proteção de dados?
É necessário estudo intenso. Conhecer o Marco Civil da Internet, a LGPD, as regulamentações sobre comércio eletrônico (decreto 7962/2013), entre outros diplomas legais. Fundamental um es- tudo comparado com o GDPR para reconhecer as formas de interpretações de sua normativa. Essencial buscar cursos de extensão ou qualificação na área oferecidos por instituições reconhecidas. E, por fim, entender que a qualificação para a atuação na área de direito digital e em especial de proteção de dados não precisa de certificações especiais, mas sim de muito trabalho e entendimento do ordenamento jurídico.