Por:
Glauco Cavalcanti
Glauco Cavalcanti é Sócio Fundador da GC-5 Soluções Corporativas e Professor da FGV. Nomeado quadro de honra pela FGV por ter sido eleito no ranking nacional melhor pro- fessor de negociação por cinco anos consecutivos. Autor do livro Empreendedorismo Decolando para o Futuro.
PhD pela Florida University, Mestre em gestão empresarial pela FGV, MBA em Marketing p e l a F G V e B a c h a r e l e m Administração pela PUC-RJ. Curso de negociação pelo Programon Negotation da Harvard Law School.
A negociação está presente em toda nossa vida. Negociamos desde que nascemos e vamos fazê-lo até morrer. Se parar para pensar, sua carreira como negociador começou muito cedo. Ao nascer você deu seu primeiro choro e naquele instante nasceu um negociador, isso mesmo, quando deu seu primeiro choro você começou a se comunicar com o mundo externo, a interagir com outras pessoas e lutar pela sua sobrevivência. Aos poucos foi percebendo que toda vez que chorava conseguia alguma coisa. Você chorava e conseguia carinho. Chorava e conseguia comida. Chorava e conseguia atenção. Toda vez que chorava conseguia algo do seu interesse e assim começou a negociar com seus pais de uma maneira muito primitiva, arcaica, mas que, de alguma forma, funcionava.
Algumas pessoas até hoje negociam desta forma. São os “bebês chorões” do mercado. Estes negociadores choram prazo, preço, forma de pagamento e garantias. Uma reprodução clás- sica daquele choro do recém-nascido que busca atender seus desejos imediatos. O modelo “bebê chorão” pode até funcionar em alguns casos, mas à medida que evoluímos nas empresas e na vida participamos de negociações mais comple- xas, precisamos de modelos mais sofisticados, principalmente quando nos confrontamos com conflitos. Toda negociação pressupõe algum tipo de conflito, seja na definição dos valores a serem acordados, seja o prazo de entrega do produto ou mesmo os termos de garantia do serviço adquirido. Se ambas as partes concordam que aquele valor é o correto, que o prazo atende à necessidade ou que os termos de garantia são justos, então por que negociar? Toda e qualquer negociação tem como princípio básico o conflito em algum nível.
Negociamos e gerenciamos conflitos todos os dias, no entanto, a grande maioria das pessoas tem dificuldade em fazê-lo. Muitas vezes gasta-se muita energia para produzir resultados peque- nos, isso porque, simplesmente, não conhecem as metodologias, as técnicas, as ferramentas e o processo de negociação e gestão de con- flitos. Na verdade, poucas são as pessoas que aprenderam a negociar na escola ou faculdade. A maioria aprendeu a negociar ao longo da vida de maneira empírica, e assim desenvolveu esta
que é uma das competências mais importantes para o crescimento profissional e pessoal. Sem saber negociar de forma eficiente as pessoas erram e vão produzindo passivos de relaciona- mento ao longo da vida. Conflitos entre empresas, nações e pessoas geram conflitos extremados, prejuízos financeiros e emocionais difíceis de serem reparados.
Algumas pessoas acreditam que a habilidade de negociação é inata e que não pode ser aprendida ou desenvolvida. De acordo com os autores- Pollan e Levine, isso é um absurdo porque não há nenhum gene especial para negociação. Quando as pessoas são confrontadas com a evidência de que outros são capazes de fazer algo que ela não pode (como, por exemplo, negociar), algumas ten- tam menosprezar essa habilidade que lhes falta dizendo que negociar é uma forma “duvidosa” de fazer negócios. Em outras palavras, acabam dizendo que, se ela não sabe negociar, deve haver algo de errado com quem sabe.
As melhores escolas de negócios do mundo nos provam que a pessoa não nasce boa negociadora. Ela aprende a ser uma boa negociadora. Existem, obviamente, casos onde o indivíduo é criado dentro de um ambiente onde os familiares possuem comércio ou então gerenciam uma empresa, sendo assim, podem aprender a partir da observação e desenvolver habilidades pela repetição. Mas para aqueles que não tiveram a sorte de nascer em ambiente formado por negociadores profissionais, a boa notícia é que é possível aprender negociação em sala de aula e praticando.
Mas afinal, o que é negociação?
Definimos negociação como um processo de comunicação multilateral, utilizado para admi- nistrar conflitos, que tem como objetivo chegar a uma decisão conjunta atendendo os interesses das partes. Importante notar que o resultado final pode ser o fechamento ou não. Pode haver o aperto de mão ou não. De uma forma ou de outra se trata de uma decisão conjunta. A negociação é o modo mais eficiente de conseguir algo que se deseja quando há escolhas a serem feitas, envol- vendo a própria pessoa e terceiros. Negociar é buscar uma decisão conjunta por meio do diá- logo, ou seja, da comunicação.
De origem latina, a palavra negotium significa negar o ócio, ou seja, o próprio ato de trabalhar e cuidar dos negócios. O “neg” quer dizer não e “otium” significa ócio ou descanso. Portanto negociar é a ausência de descanso, ausência de folga e negação do ócio. Interessante notar que o termo pode ser aplicado não apenas no meio empresarial, mas em todas as circunstâncias vividas em que há oposição de ideias, ou seja, conflitos. A negociação é aplicada em muitas situações, especialmente na administração de conflitos, quer nas relações interpessoais ou intergrupais. A existência de duas ou mais par- tes conduz inevitavelmente ao conflito, o que é normal no campo pessoal, profissional e familiar.
Uma abordagem mais moderna sobre conflitos mostra que eles são necessários ao relaciona- mento humano e que a falta de conflitos entre as pessoas muitas vezes pode ser um sinal de problema. No caso de cargos de gerência nas empresas, por exemplo, quando duas pessoas sempre concordam, uma delas é desnecessária. Através dos conflitos surgem novas ideias, inovação, mudança e eles são fundamentais para o crescimento de pessoas e empresas. Em relacionamentos pessoais o conflito mostra interesse ou necessidade, na maioria das vezes, tal como uma objeção de um cliente do tipo: “Seu preço é mais caro”. Se a outra parte está conflitando é porque está interessada. Negociação é um exercício de influência, portanto precisamos ser capazes de entender a outra parte a fim de convencê-la.
Pollan e Levine, argumentam que depois de ler e escrever, a negociação é a mais importante e essencial habilidade para alcançar o sucesso pessoal e financeiro. Negociadores, de acordo com os autores, são pró-ativos, não aceitam as coisas como elas são e acima de tudo são ques- tionadores sobre como a negociação poderia ser feita melhor. Eles afirmam ainda que, se leva- dos em consideração os conceitos básicos da negociação, poucos negociadores são eficazes, apesar de negociarem inconscientemente todos os dias da vida. Uma negociação bem-sucedida requer condições que nem sempre são atendidas pela postura informal utilizada. Para os autores, as pessoas não sabem negociar por três razões: I – porque ninguém na escola ou na família ensi- nou-os a fazê-lo; II – as pessoas não acreditam que é possível aprender a negociar; III – medo de negociar.
Estes fatores limitantes dos indivíduos os afas- tam de bons acordos e geram alto grau de estresse na mesa de negociação. Os negocia- dores precisam fazer com que o processo seja menos empírico e intuitivo para se transformar em algo fundamentado na teoria e com um passo a passo estruturado que permita alcançar resul- tados superiores. Sem dúvida o conhecimento de negociação pode aumentar, e muito, as chances do negociador atingir melhores acordos. Afinal, todos nós somos negociadores.